Hidrelétricas não poderiam ter minimizado os desastres climáticos no RS e em SC?, questiona o presidente da ENERCONS

Por que o ministério insiste em não permitir Audiências Públicas, quando o tema envolve as hidrelétricas que não foram construídas no RS e SC?

Hidrelétricas não poderiam ter minimizado os desastres climáticos no RS e em SC?, questiona o  presidente da ENERCONS
Foto: Divulgação ENERCONS

Reunidos no 3º Fórum Mundial da Água, em Kyoto (2003), 170 países concluíram que toda geração hidrelétrica é renovável e merecedora de apoio internacional. Por que então, no RS e em SC há décadas não construímos hidrelétricas que poderiam ter atenuado enchentes durante os últimos 50 anos? Por que no Paraná, nos terços médio e baixo do rio Iguaçu no PR, no qual  a COPEL construiu seis hidrelétricas, há mais de 30 anos não acontecem enchentes como antes?

Transcorridos alguns dias das enchentes catastróficas que quase destruíram o Rio Grande do Sul, o ministério de minas e energia, divulgou a “consulta pública” 165/24, visando estabelecer diretrizes para um novo leilão de compra de energia elétrica renovável, inclusive hidrelétrica, para o Brasil.

Quase ao mesmo tempo, na semana passada, a secretaria de comunicação social da presidência da república divulgou um estudo realizado pelo Instituto Nacional de Pesquisa Espacial usando dados de chuva desde 1961.

O trabalho do INPE prova que nesses 63 anos existiu aumento de 30% nas chuvas na região sul e redução em até 40% nas demais regiões. Mesmo assim, como se nada estivesse acontecendo, o ministério, mais uma vez, ao colocar em consulta o edital das diretrizes do novo leilão fez questão de descumprir a lei que obriga realizar uma Audiência Pública Presencial, que permita debates, nos casos de interesse geral. E não simples envio de contribuições.

Será que o ministério de minas e energia não considera que seja um assunto de interesse geral a destruição da economia do Rio Grande do Sul, a quinta do Brasil, talvez em grande parte por falta de hidrelétricas que pudessem diminuir os efeitos das cheias, como aconteceu no Paraná?

Será que por possuir em seu território 89% das reservas de carvão do Brasil, o RS não poderia ter exagerado no uso de térmicas e deixado de lado o emprego de hidrelétricas que poderiam ajudar no armazenamento das águas e contenção das enchentes?

Como sempre, ao fazer perguntas nos arriscamos a ouvir as respostas.

“Não perturbem o ministro. Ele não tem culpa da enchente, pois a culpa é de São Pedro!’’ dirão alguns! “A culpa é do prefeito. E aqui no RS não temos tantos bons potenciais como o PR”dirão outros.

Quando as coisas ficam radicalizadas, a melhor resposta pode vir de fazermos as perguntas certas:

  1. A falta de hidrelétricas com mais e maiores reservatórios com capacidade de armazenamento teriam atenuado a gravidade dessas enchentes e de todas as que vem ocorrendo nas últimas décadas no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina?
  2. A não construção dessas hidrelétricas pode ter a ver com nesses leilões a definição do tipo de energia a ser comprada depende apenas do preço da energia, não importa como ela seja produzida?
  3. Seria correto não considera os efeitos colaterais, ou externalidades de sua produção, como por exemplo, esse benefício de poder armazenar água e de não emitir gases poluentes?

 

“Isso é conversa de ambientalista! Vocês querem colocar a culpa da enchente no Silveira que chegou agora!”dirão alguns! “A culpa é do prefeito e do governador”dirão outros.

Mais uma vez vamos tentar fazer as perguntas mais importantes, para chegar a uma conclusão equilibrada:

  1. Por que será que o ministério, órgão do governo federal, poderia não quer fazer uma audiência pública presencial, envolvendo a sociedade, a indústria, o comercio, a agricultura, do Rio Grande e do Brasil?
  2. Será que essa população já foi avisada que dentro de alguns dias técnicos de empresas privadas e governo decidirão se vamos usar derivados de petróleo importados ou água corrente nacional para gerar energia?
  3. Será que os consumidores do nordeste, sudeste, centro oeste e norte, onde as chuvas diminuíram até 40%, secando até rios caudalosos, afluentes do próprio rio Amazonas, não deveriam participar dessa audiência pública?
  4. Será que basta uma consulta por correspondência, como formalidade para validar decisões sem ouvir os consumidores gaúchos e catarinenses, que a cada três anos são vítimas de enchentes pela falta hidrelétricas?
  5. Qual seria o inconveniente de ouvir a população, os técnicos, a academia, as entidades? Será que o ministério não tem interesse em apurar falhas técnicas que possa ter havido nos leilões anteriores, que pelo critério do preço do quilowatt-hora, inviabilizaram a construção de hidrelétricas nesses dois estados e nos demais onde o problema são as secas?
  6. Será que os técnicos não querem debater em público suas ideias e certezas, nem os erros de outros técnicos e dirigentes? Será que estes erros poderiam ter causado a não construção de hidrelétricas com reservatórios de acumulação plurianual?
  7. Será que o ministro Silveira acha que as secas terríveis e as enchentes catastróficas que vem ocorrendo são coisas naturais, que não tem jeito de consertar por serem consequência inevitável na medida em que a cobertura vegetal muda para dar lugar à agricultura, que é tão necessária?

“Que adiantaria promover uma Audiência Pública Presencial se os presentes não são capacitados?” gritarão os mais exaltados. “Vocês estão desacreditando da capacidade dos técnicos do ministério? Quem vocês pensam que são?”murmurarão entre dentes os mais tímidos.

De novo vamos fazer perguntas bem básicas e educadas para tentar encontrar o melhor caminho:

  1. Será que os técnicos que não querem audiência pública presencial ainda não entenderam que estes serão leilões decisivos, não só para gaúchos e catarinenses, pois de acordo com essas novas regras, iremos -comprar mais energia renovável das hidrelétricas ou das termelétricas fósseis?
  2. Será que os nordestinos e nortistas que enfrentam secas cada vez maiores estão sabendo que não construir mais hidrelétricas que acumulem água para viver e manter suas lavouras só pode ser discutida pelo correio eletrônico?
  3. Será que comprar renovável e permanente seria algo tão difícil de compreender que apenas deve ficar restrito às empresas privadas e ao ministério?
  4. Ou será os assessores do ministro não acreditam no estudo do INPE, nem em mudanças climáticas, nem nas séries históricas de vazão?
  5. Será que para o MME existe “neutralidade tecnológica” e só o preço da energia é que interessa, não importando quantos mortes ocorram, quantas indústrias sejam destruídas, quantas colheitas perdidas, pontes destruídas, hospitais e escolas inundados?
  6. Será que é por isso que o Poder Executivo ainda não cumpriu a lei obrigação prevista na Lei 14.182 de considerar nos leilões os benefícios e prejuízos que cada forma de gerar energia traga para a população e não apenas o seu preço?
  7. Será que o ministro ainda não sabe que apenas o preço do quilowatt hora para escolher a fonte de energia a ser usada é algo que pode ser totalmente manipulado se alguém errar nas premissas de cálculo do índice custo-benefício como aconteceu em 2008 com a Nota Técnica EPE DEE RE 0099/08, em seu item 2.1, que não considerou a tendência hidrológica nem as perdas elétricas no cálculo da garantia física das hidrelétricas?
  8. Será que a intenção é essa mesma, de não corrigir os erros nas premissas acima, permitindo que os novos leilões sejam mais do mesmo, atribuindo novos contratos bilionários às térmicas de propriedade de conhecidas figuras da política nacional?
  9. Será que a assessoria de Sua Excelência acha que 170 conterrâneos gaúchos mortos e mais de 15 bilhões de reais de prejuízo em grande parte pela não existência de hidrelétricas que reduzam a velocidade de escoamento não são de interesse geral?
  10. Será que a assessoria ainda acha que vai bastar uma consulta não publica e não para convencer o Brasil, que tem o 3º maior potencial hidrelétrico remanescente no mundo de que temos de obedecer às ONGs pagas pela indústria do petróleo, que não querem que a gente nunca mais construa novas hidrelétricas?

 

*Ivo Augusto de Abreu Pugnaloni é engenheiro eletricista e foi diretor de planejamento da COPEL e diretor presidente da COPELDISTRIBUIÇÃO, do Instituto Estratégico do Setor Elétrico (ILUMINA), fundador e primeiro presidente da ABRAPCH, associação brasileira de pequenas hidrelétricas, secretário adjunto de transportes de Curitiba, membro do Conselho Estadual de Ciência e Tecnologia do Paraná. professor do Centro Federal de Educação Tecnológica do Paraná.  Hoje Ivo é o presidente da ENERCONS Consultoria em Energias Renováveis. www.enercons.com.br

FONTE : REDE CATARINENSE DE NOTÍCIAS

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